A prática do Silêncio é vivenciada no cotidiano de Nazaré Uniluz como um convite para nos abrirmos a uma escuta mais profunda… parar… ouvir… sentir, possibilitando assim um alinhamento com nosso ser essencial.
Uma outra qualidade do silêncio
Quando você pensa em “silêncio”, pode ser que a primeira coisa que vem à sua mente é “não falar” “cale a boca”, “não fale besteira”, “temos dois ouvidos e uma boca para ouvir mais do que falar”? Muitas vezes o silêncio nos foi imposto e aprendemos a engolir nossas palavras, não expressarmos nossos pensamentos, ideias e opiniões. Às vezes é melhor ficar em silêncio para evitar conflitos, para não ser julgado ou rejeitado.
Em Nazaré Uniluz exercitamos uma outra qualidade do silêncio. Não uma que nos impede de nos expressarmos, mas sim uma que nos convida a prestarmos atenção na qualidade do que expressamos.
Entrelaçamento com os princípios de Nazaré Uniluz
Meditação sem silêncio é possível? São muitas as opções de meditações guiadas ou ativas, e o silêncio é sempre interno, é escuta interior. Atenção plena – ações conscientes necessitam de silêncio para prestar atenção. Comunicação sustentável – fundamental silêncio para uma escuta com qualidade. Assim também é com os demais princípios.
Estar presente inclui ouvir o que acontece dentro e fora de nós. O silêncio é o espaço onde “lemos” a experiência, como essa folha em branco onde estou digitando essas palavras agora, e você consegue ler com facilidade devido aos espaços que existem entre as palavras, nãofosseasssimtambémseriapossíveller,masumpoucomaisdesafiantetalvez.
Momentos e espaços de silêncio
Faz parte dos acordos em Nazaré Uniluz respeitarmos momentos e espaços de silêncio.
Os espaços de silêncio são as casas de hospedagem, onde ficam os quartos individuais, por serem espaços de recolhimento, e a sala de meditação, que fica aberta o tempo todo para quem quer que se sinta chamado a meditar, mesmo fora dos horários de meditação coletiva. Nesses horários, é pedido que respeitemos o silêncio em todo o campus. Uma forma de nos alinharmos e sintonizarmos com o ritmo e propósito do espaço.
No restante do tempo, o silêncio permeia os espaços entre as atividades, e nas rodas de abertura e fechamento sempre fazemos um momento de silêncio e sintonização. Trazemos nossa presença através do silêncio da fala e da ação.
Todos os dias exercitamos o silêncio da fala entre as 22h00 e 08h00 – oportunidade para sair do automático, integrar as experiências do dia, perceber o movimento interno da noite e iniciar o dia com atenção em si, nos nossos processos. Vamos ao encontro do outro depois de termos estado conosco durante esse período de silêncio, que para alguns é bem desafiante.
Atualmente, no período da manhã das quartas-feiras, as atividades são realizadas em silêncio. Um pequeno “retiro de silêncio” vivenciado a cada semana.
Retiros de Silêncio
Quanta energia gastamos digerindo e respondendo aos estímulos externos, pensamentos e ações?
Os retiros de silêncio são oportunidades para levarmos nossa atenção para dentro. Para aprofundarmos o contato com o nosso “centro”. Para percebermos e liberarmos os excessos que dispersam nossa atenção e energia e nos confundem e nos limitam. Podemos perceber quem somos sem a interferência de outras pessoas, o que nos habita e nos condiciona e que geralmente projetamos fora.
Os Retiros de Silêncio de Nazaré Uniluz são abertos a todas as pessoas que se sintam chamadas para esse aprofundamento em si mesmas, sem direcionamento de outros. O focalizador e equipe de apoio, a partir da reunião de abertura, clareiam os acordos e explicam como as atividades serão realizadas e as possibilidades que o silêncio abre nesta ação de estar consigo mesmo. Pode ser só o silêncio da fala, mas pode-se também ampliar e experimentar ficar sem ler, sem escrever… pode trazer um silêncio no movimento, atento ao ritmo e movimentação corporal, experimentar a quietude também na ação, entre outras possibilidades.
A experiência é individual, respeitando o movimento do grupo, cada um é mestre de si mesmo, e o convite é partilhar as experiências no final do período ou encerrar mantendo o silêncio.
Além desses Retiros de Silêncio, Nazaré Uniluz também oferece outros retiros de silêncio específicos, com abordagens budista, hinduísta, cristã, para atender as diferentes necessidades das pessoas.
Vivenciando o silêncio como um exercício individual
É comum alguém que está em Nazaré, seja um participante temporário ou mesmo um residente, sentir necessidade de aprofundar o exercício de silêncio da fala por mais tempo do que o acordado para o grupo. Nesses casos é sinalizado para o grupo esse exercício, comunicando diretamente ou usando um crachá com a informação de que está em silêncio. Assim, continua-se vivenciando as atividades normalmente, mas não interage verbalmente com os outros e busca mais recolhimento nos intervalos entre as atividades.
No período em que fui residente em Nazaré Uniluz, tive oportunidade de conviver com pessoas que lá iam para fazer retiro de silêncio individual. Armando era uma dessas pessoas. Regularmente ele passava um período em silêncio no campus, interagindo pontualmente com o grupo, conforme seu processo interno. Sou grata pelas oportunidades que tive de trocas com ele. Em uma ocasião ele se ofereceu para me acompanhar à cidade de Nazaré Paulista para buscar um datashow que alugávamos para um curso que iria acontecer naquele fim de semana. Estava acontecendo uma festa na praça da cidade e o datashow que fui buscar estava sendo usado. Foi necessário esperar um tempo por ele. Lembro de ter me sentido atordoada no meio das pessoas e do som alto. Olhando para o Armando lhe disse que imaginava que devia estar sendo difícil para ele ter saído do retiro de silêncio e estar lá naquele barulho todo. Ele, impassível ao meu lado, me falou: quem disse que eu saí do retiro de silêncio?
Desafio do dia a dia
Na correria dos afazeres, na confusão de informações e estímulos, às vezes nos perdemos. Nos perdemos de nós mesmos, nos perdemos nas relações, perdemos o foco, a direção… Barulho, caos, conflitos…
Dentro e fora. O tempo todo.
Quantas vezes você já se sentiu “cheio”, precisando “esvaziar” para encontrar o fio da meada que te conduz pelo seu caminho?
“Ao te esvaziares, chegarás à plenitude. Ao silenciares, cruzarás fronteiras”, é o que nos diz Trigueirinho, um dos fundadores de Nazaré Uniluz.
Silêncio é uma necessidade. E também um desafio. A paz interior é colorida de quietude e silêncio. Como disse Samuel Murad: “Na música, Pausa também é Nota. E a vida soa melhor se a gente aprende que há valor no Silêncio.”
Aceita um desafio de silêncio? Como fazemos em Nazaré Uniluz, que tal experimentar o silêncio da fala durante um período em um dia da semana? Ou, se preferir, um período do dia (início da manhã e/ou noite) durante uma semana?
Por Rosangela Gonçalves, janeiro/2021.
Graduada em Serviço Social pela UNESP em Franca-SP, pós-graduação em Psicologia Transpessoal por Nazaré Uniluz, terapeuta com cursos de massagens, florais, terapia corporal e energética. Tecelã e focalizadora de Danças Circulares.
Em 2007-2008 foi residente em Nazaré Uniluz. Depois desse período foi coordenadora por três anos do Programa Viver em Grupo – metodologia básica desse espaço.