Muitas pessoas dizem ser difícil manter a prática diária de meditação mindfulness, manter um ritmo. Por um tempo, conseguem praticar de forma regular, depois abandonam, depois voltam….
Se você se identifica com essa situação, tenho certeza de que sente os efeitos disso. É como uma prática, por exemplo, física, como ir à academia um tempo e depois sair. Tem efeitos imediatos. Claro: se você, quando adolescente, praticou bastante atividade física, isso ajudou na sua constituição física. E você vai carregar esses efeitos para sempre. Mas, se você parar de praticar, você pode ficar obesa. Você pode ficar com mais dores quando tiver lá seus 40, como eu, que estou precisando voltar à atividade física, inclusive.
É a mesma coisa na meditação. Se você aprende algo sobre mindfulness, faz um curso, começa a praticar, colhe benefícios disso. E você nunca vai perder esse novo olhar para a vida, esse novo jeito de ser e algumas das capacidades que você desenvolve. Mas, se parar de fazer a prática, você pode “se esquecer” um pouco. E muitos dos nossos hábitos, dos nossos condicionamentos, do piloto automático de cada um de nós, são muito profundos. São questões que a gente adquiriu, às vezes, no útero, e que foram reforçadas durante a vida. É preciso bastante treino para alguns deles realmente se reverterem e mudarem, e a gente poder encontrar um espaço de criatividade constante para lidar com a vida, em vez de ficar repetindo padrões.
O interessante é que, quanto mais você praticar – sejam 10, 15, 20 minutos, meia hora –, mais dará vontade de fazer. Em algum momento nessa caminhada, você começará efetivamente a trazer a prática para o dia a dia, para os momentos de não prática. Você estará cultivando o estado de ser, não estará fazendo nada, apenas sendo.
Respirando… Só a consciência de estar respirando já tem alguns “efeitos colaterais” no resto da vida. A gente vai mudando. E chega o tempo em que percebe que, às vezes, até no fazer – ou cada vez mais no seu fazer –, você está fazendo e atuando no mundo a partir desse estado de consciência. A partir da consciência da irritação, e não a partir da irritação, por exemplo. A partir da consciência do medo, e não a partir do próprio medo. Isso vai se impregnando em você.
Eu me lembro de um grande mestre, Tarchin Hearn, autor dos livros “Respirando”, “Satipatthana” e “Caminhando em Sabedoria”… Ele esteve aqui no Brasil, e uma pessoa perguntou como era a prática dele. Ele falou: “Eu vou te dar uma resposta que vai te decepcionar um pouco. Eu não pratico mais desse jeito. Eu não me sento e fico fazendo uma prática. Eu pratico o tempo todo.”.
Para ele chegar lá, foram horas e horas e horas, e anos e anos e anos praticando como nós praticamos: sentar-se, deitar, andar e fazer uma prática formal. Quanto mais você pratica e mais aprofunda essa sua capacidade de tranquilidade e centramento como base, mais a capacidade de compreensão da condição humana, do que nós somos, vai aumentando.
É muito bonito. Continue, mantenha a sua capacidade de prática. No dia em que não for possível sentar e praticar 20 minutos, meia hora, 40, tudo bem, faz só um pouquinho. Quando há um dia muito cheio aqui, e não consigo parar, na hora de pôr a minha filha para dormir, há aquele momento, logo antes de adormecer, em que ela fica bem quietinha. Nesse momento, eu estou deitado e eu posso fazer um escaneamento corporal. 10 minutos. Pratiquei. Sempre dá para incorporar no dia.
Por Luiz Ribeiro, novembro/2023.
Luiz Ribeiro é um dos primeiros instrutores de mindfulness formados no Brasil e também Coordenador do SerCiente – Formação para Instrutores de Mindfulness em Nazaré Uniluz